Se houvesse um tudo
Se houvesse um tudo, seria imenso, derrubaria o muro que limita o tempo, derramar-se-ia pela pele numa correria. Se esse tudo fosse um mundo, não seria esférico, seria etéreo, disforme e imensurável, um espaço louco onde caberiam todas as partes.
Mas neste universo tudo é medível, tudo pesa. Por mais leve que a alma seja, também tem peso, uma gramas que fazem a diferença naquilo que vejo. Aqui tudo tem forma. Mesmo aquilo que não se enforma, molda-se e adaptasse ao lugar de encaixe onde o corpo é curva mesmo quando se dobre e se abaixe.
Quisera eu ser navegante nesse mar estonteante onde nem vagas houvesse, apenas fumo feito de um nevoeiro fino, como fino é teu cabelo nas ondulações onde o meu cabelo deito. Quisera meu barco ser de papel, ser leve como um corcel, para que deslizasse suavemente sobre a tua pele.
Se houvesse um tudo, esse mundo seria teu, e nele moraria eu.
© 2019 António Almas
Imagem: quadro de ADOLPHE ALEXANDRE LESREL (1839-1929)